
por André Capella
Embora o acesso de crianças e jovens brasileiros à escola tenha aumentado significativamente nos últimos 20 anos, é indiscutível entre os especialistas da área que a qualidade da educação básica ofertada no sistema público e até mesmo privado é de baixa qualidade e precisa ser melhorada urgentemente.
Segundo dados da última edição do Programa Internacional de Avaliação dos Estudantes (PISA), que avaliou o desempenho de estudantes de 15 anos de idade em matemática, linguagem e ciências em 65 países e territórios no ano de 2012, o Brasil encontra-se na 58ª posição, atrás de países também em desenvolvimento como Chile, México, Uruguai e Costa Rica, por exemplo.
Embora frequentem a escola, nossos jovens não aprendem competências básicas como fazer as quatro operações matemáticas ou interpretar textos de baixa complexidade. Lamentavelmente, isso tem impactos diretos e severos na competitividade da economia brasileira frente a outras economias. É uma situação incômoda, que nos faz refletir sobre quais caminhos devemos seguir para alcançarmos melhores resultados e, com isso, nos tornarmos um país mais próspero e eficiente.
Nesse sentido, faço a seguir três sugestões objetivas que poderiam ser implementadas nos próximos anos e teriam grande impacto na qualidade da educação básica ofertada.
1) Criação de Vouchers Educacionais: gostemos ou não, a educação pública básica brasileira encontra-se em situação de falência em decorrência de um sistema de ensino que oferece muitos direitos aos professores em detrimento do direito de aprender do aluno. Essa política ocorre há muitas décadas como forma de compensar o professor pelos baixos salários que as Secretarias de Educação de estados e municípios oferecem.
Desse modo, além de gozarem da estabilidade no emprego (como os demais servidores públicos), os professores do ensino básico possuem benefícios como licença-prêmio, faltas ao trabalho sem a necessidade de apresentação de justificativa, licenças médicas de longa duração e outros benefícios que acabam por retirar o professor do local onde ele deveria estar, a sala de aula. Isso compromete o desempenho dos alunos que, muitas vezes, ficam semestres inteiros sem professores de química, física ou matemática, por exemplo.
Como se trata de uma longa batalha com os sindicatos de professores para que tais benefícios (ou privilégios) possam ser retirados, a solução mais prática para o curto/médio prazo seria retirar, gradativamente, os alunos das escolas públicas passando-os para a escola privada. Neste caso, as Secretarias de Educação ofereceriam aos pais desses alunos um voucher (vale) educacional que lhes daria a opção de escolher uma escola particular para matricular seu filho.
A questão de o aluno não ter algumas disciplinas durante o ano letivo por falta de professor estaria resolvida, afinal, professor da escola particular não faz greve, nem falta ao trabalho sem apresentar justificativas e quando está de licença médica é imediatamente substituído por outro professor. Todavia, reside uma outra questão apontada pelo PISA: mesmo as escolas particulares no Brasil apresentam baixa qualidade quando comparada a escolas públicas e privadas de outros países.
Como mudar tal realidade?
2) Salários iniciais mais atrativos para a carreira do magistério: um estudo realizado no final dos anos 2000 e amplamente divulgado pela Fundação Lemann mostrou que os 30% piores alunos do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) são aqueles que escolhem a carreira do magistério. Já os 30% melhores escolhem carreiras como medicina, direito e engenharia onde os salários iniciais são mais atrativos. Isso traz um novo problema para o aluno, uma vez que quem vai ensiná-lo não são as pessoas mais preparadas, que tiveram uma formação sólida e dominam competências nas áreas de ciências, matemática, português e inglês. Ao contrário, o professor daquele aluno será exatamente aquela pessoa que teve o pior desempenho no ENEM e que, provavelmente, possui sérias defasagens de aprendizagem.
Para solucionar tal problema é necessário que os salários iniciais dos professores da educação básica sejam similares aos salários iniciais ofertados pelo mercado a médicos, engenheiros e advogados (claro, isso sempre levando-se em consideração o restrito orçamento que estados e municípios possuem). Desse modo, os melhores alunos do Ensino Médio olhariam para a carreira do magistério como algo atrativo. Para não gerar um déficit ainda maior nas contas públicas de estados e municípios por conta desse aumento no salário inicial, com o passar do tempo, os salários no meio e no término da carreira não teriam grandes aumentos. Isso poderia gerar um êxodo de professores para outras carreiras, mas estudos realizados em outros países mostram que os professores que efetivamente possuem vocação para ensinar permanecem no magistério mesmo com um salário que não vai aumentar substancialmente com o passar do tempo.
Ademais, como as escolas passariam a ser privadas já que os vouchers seriam oferecidos à população progressivamente, o regime especial de aposentadoria dos professores deixaria de existir no longo prazo (dentro de 30, 40 anos), já que todos os professores passariam a se aposentar pelo INSS. Isso diminuiria a pressão que os governos estaduais e municipais sofrem com o pagamento de aposentadorias e pensões. Por último (mas isso demanda um lobby pesado no Congresso Nacional), a idade mínima de aposentadoria do professor teria de ser aumentada de 55 para 65 anos.
3) Reforma do currículo dos cursos de pedagogia oferecidos pelas Instituições de Ensino Superior (IES): lamentavelmente, quem escolhe cursar Pedagogia no Brasil geralmente passa os quatro anos de duração do curso lendo uma série de publicações que pouco contribui para a melhoria de sua técnica de ensino em sala de aula. Os cursos de pedagogia exigem a leitura de textos de Karl Marx, Weber e, obviamente, muito Paulo Freire, mas pouco sobre como ensinar o aluno com objetividade e criatividade. Há muita teoria e pouca prática durante a graduação. Aí, quando esse aluno se forma e cai em uma sala de aula com 30 a 40 alunos, ele tem pouca desenvoltura para lidar com a situação e acaba por dar uma aula medíocre, pouco atrativa ao aluno.
No início dos anos 2000, um professor da Universidade de Stanford chamado Martin Carnoy visitou diversas salas de aula em escolas públicas do Brasil e constatou que seus professores ensinavam seus alunos escrevendo o conteúdo dos livros na lousa e pedindo que eles copiassem. Não havia a apresentação de trabalhos individuais ou em grupo e tampouco o professor fazia perguntas aos alunos ou organizava gincanas ou competições dentro da sala de aula que os motivassem.
Para mudar essa situação, a sugestão seria alterar o currículo do curso de graduação em Pedagogia, tornando-o mais prático e menos teórico. Matérias como sociologia, filosofia e afins dariam espaço a disciplinas como técnicas didáticas, por exemplo.
Acredito que as sugestões acima elencadas ofereceriam novos alicerces para a educação brasileira dar o salto de qualidade que tanto necessita.
André Capella é bacharel em Relações Internacionais e atuou, na área de educação, como Coordenador de Projetos da Fundação Lemann.