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Editorial: Os riscos e oportunidades da Reforma Tributária
Não é novidade que o Brasil tem os impostos mais complicados do mundo e que o Congresso deve aprovar sem demora uma reforma tributária. Com mais de 32 mil normas tributárias em vigor, nem mesmo fiscais, contadores e advogados tributaristas se entendem sobre quanto imposto uma empresa deve pagar. Os valores disputados entre a receita e o contribuinte chegam a R$ 5,4 trilhões, ou 75% do PIB (e 267 vezes a média da OCDE).
Esse manicômio tributário espalha diversas ervas daninhas por nossa economia. A mais imediata é obrigar os brasileiros a gastar escassos tempo e dinheiro tentando entender como pagar impostos. O sistema também cria insegurança jurídica (pois ninguém sabe muito bem se está recolhendo impostos corretamente) e dá força a atividades pouco produtivas. Por exemplo, casas pré-fabricadas, por serem produtos industrializados, pagam o dobro de impostos que a construção de casas no local, atividade que é considerada um serviço.
Considerando que as distorções se concentram nos impostos sobre o consumo, faz sentido começar uma reforma por esse ponto. A princípio, esse é o objetivo do projeto em discussão no Congresso, que deve ser votado esta semana.
O texto ainda é preliminar e deve ser alterado. Mas, em linhas gerais, a reforma pretende unificar 5 tributos diferentes (ICMS, IPI, PIS, Cofins, ISS) em um Imposto sobre Valor Agregado (IVA) dual com legislação única. Em nível federal, será cobrado o CBS; nos estados e municípios, será aplicado o IBS.
A reforma simplifica o pagamento de impostos, desonera exportações e investimentos, e elimina a cumulatividade, ou seja, a incidência de tributos sobre tributos.
O fim da cumulatividade é essencial para a indústria nacional. Considere, por exemplo, uma fábrica de portas e janelas metálicas que compra chapas de aço como matéria-prima. A empresa paga tributos ao adquirir as chapas e paga novamente ao vender seu produto final. Com a reforma, os tributos já pagos se tornarão créditos que a fábrica poderá descontar dos impostos que deve.
Além de diminuir a carga para a indústria, a reforma cria incentivos para reduzir a sonegação, já que compradores, de olho nos créditos, devem dar preferência a fornecedores que pagaram impostos corretamente. Ao contrário dos créditos tributários atuais, que com frequência são ignorados pelos governos estaduais, a ideia é que os novos créditos sejam financeiros, caindo de imediato na conta de cada CNPJ.
Todas essas mudanças são positivas e podem contribuir para o crescimento do País. No entanto, o diabo mora nos detalhes.
Em primeiro lugar, a quantidade de exceções é preocupante. Categorias do setor de serviços, o mais afetado pela reforma, pressionam os parlamentares por isenções e reduções. Já há alíquotas diferenciadas ou isenções para setores inteiros, indo de prêmios na loteria até atividades artísticas. Sem uma base sólida, é provável que o novo sistema seja emendado e deteriorado ao longo dos anos, assim como aconteceu com o PIS/Pasep, a Cofins e o ICMS.
O mesmo se aplica à manutenção de regimes especiais, como a Zona Franca de Manaus. Como seria possível migrarmos para a tributação no destino, ou seja, no local onde os bens são consumidos, quando é exatamente a tributação na origem que permite a existência desses regimes?
Também há o risco de aumento da carga tributária. A PEC estabelece uma alíquota única, mas não especifica qual será essa alíquota. Uma forma de evitar o aumento da carga tributária foi apresentada em 2019 pelo então deputado federal Alexis Fonteyne (NOVO-SP). A emenda 44 cria um gatilho automático para reduzir as alíquotas caso a arrecadação aumente acima do crescimento do PIB, limitando a carga tributária total a 28% do PIB.
Por fim, há a preocupação dos estados com a perda de autonomia. O projeto prevê a criação de um Conselho Federativo para centralizar a arrecadação dos estados e municípios, concedendo poderes para criar normas, regulamentos e até propor leis. Estados populosos, como Minas Gerais, podem ter o mesmo poder de voto de estados menores.
Para resolver esse impasse, há algumas opções em jogo. Uma delas é manter a arrecadação descentralizada nos estados e fiscalizar as transferências devidas entre eles. Outra seria alterar a estrutura do Conselho Federativo, dando mais peso à população dos estados no poder de decisão.
Os deputados precisam resistir à pressão de grupos organizados tendo uma certeza em mente: a carga tributária total que os brasileiros pagam não pode, de modo algum, aumentar. Simplificar é importante, mas isso não deve servir de desculpa para aumentos de impostos.
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