Editorial: O retorno do ‘ciclismo fiscal’ – o PT quer reescrever a história e repetir os mesmos erros

23 de agosto de 2023

Conforme um velho adágio, às vezes atribuído a George Orwell, a história é contada pelos vencedores. Após 6 anos derrotado e afastado do poder, o PT retornou ao governo levando essa máxima ao pé da letra. Há um enorme esforço de reescrever alguns dos capítulos mais constrangedores da história recente do país. O motivo? Justificar a adoção das mesmas políticas do passado, que colocaram o país numa grave crise econômica e culminaram no fim antecipado da última gestão petista. 

É o caso das “pedaladas fiscais”, o crime de responsabilidade que resultou no impeachment da presidente Dilma Rousseff em 2016. Com o arquivamento do processo pelo TRF-1, nesta segunda-feira, a militância petista repercutiu uma versão enganosa da notícia de que a justiça teria “inocentado” Dilma de qualquer crime. Repetindo o bordão de que o impeachment foi “golpe”, a nova história é de que as pedaladas nunca aconteceram – e se aconteceram, não foram nada de mais.

Essa história só se sustenta na memória curta e seletiva da militância esquerdista. Ainda em 2013, o governo federal começou a atrasar sistematicamente os repasses de recursos do tesouro para os bancos públicos. Na prática, os bancos públicos estavam emprestando dinheiro diretamente ao governo federal, mantendo os pagamentos do governo (como benefícios sociais, Plano Safra, INSS) em dia. A maquiagem das contas públicas foi deliberada e estratégica, particularmente no ano eleitoral de 2014. A presidente Dilma Rousseff não teve que enfrentar a realidade do desastre nas contas públicas do seu governo durante a campanha. As pedaladas não só aconteceram como foram cruciais para a vitória apertada em sua reeleição.

O arquivamento do processo contra Dilma não apaga essa história. Significa, apenas, que a ex-presidente não vai responder judicialmente pelo crime de improbidade. Esse papel cabe ao Congresso Nacional, onde Dilma foi julgada e condenada com a perda do cargo, num processo supervisionado pelo STF e com amplo direito à defesa. Não custa lembrar que o ex-presidente Collor também teve os processos arquivados pelo STF, e nem por isso seu impeachment deixou de ser legítimo. Cabe ressaltar, ainda, que um dos motivos que levou o TRF1 ao arquivamento foi uma mudança na Lei de Improbidade Administrativa em 2021 (que o NOVO foi contra), que passou a exigir a vontade livre e consciente (dolo) do agente para a condenação. O MP não conseguiu imputar o dolo da conduta da ex-presidente – o já conhecido bordão de “eu não sabia” foi suficiente.

A verdade é que o PT não se arrepende das pedaladas, apenas de ter sido “pego” por elas. A ética e as boas práticas de governança são secundárias em relação ao projeto de poder petista. A realidade é subalterna da narrativa política.

No governo atual, já temos sinais de que o Ministro da Fazenda, Fernando Haddad, pode levar as pedaladas para além das ciclovias. No Orçamento deste ano, a Fazenda incluiu como receita cerca de R$ 3,2 bilhões a mais em depósitos judiciais na Caixa, mesmo sem ter certeza se o dinheiro é, de fato, do governo.

Além disso, o economista Marcos Mendes recentemente identificou outras instâncias em que o governo arrisca uma “contabilidade criativa”: a exclusão de R$ 5 bilhões no déficit das estatais, que, num passe de mágica contábil, se transformariam em “investimentos” no novo PAC; e a inclusão de R$ 26 bilhões de ajuste patrimonial oriundo do Pis/Pasep como “receita primária”, contrariando as boas práticas internacionais de contabilidade pública.

Um governo que não tem pudor em maquiar as contas públicas é um governo que não passa qualquer confiança para a sociedade. O Brasil já sofre com o problema da insegurança jurídica, agravado por um judiciário ativista e que extrapola os limites de sua atuação. Agora, ainda precisa lidar com a insegurança fiscal, com a desconfiança sobre o quanto o governo gasta e arrecada, sobre o tamanho da dívida pública que as próximas gerações terão que pagar. Nenhum país consegue crescer na contramão dos fatos, manipulando a realidade com ilusões e narrativas.

Para evitar que os erros do passado se repitam, é preciso impedir que a própria história seja reescrita. Pedalada fiscal é prejudicial à saúde de qualquer governo. E é crime de responsabilidade. O NOVO estará atento para fiscalizar e denunciar qualquer tentativa do governo de esconder a realidade.

Confira outras publicações do Editorial da Semana

Receba nossas

novidades por

email!