João Amoêdo e Marcelo Freixo debatem nas redes sociais sobre saneamento

30 de maio de 2019

João Amoêdo, presidente nacional do NOVO e o deputado federal, Marcelo Freixo (PSOL – RJ), debateram na última terça-feira (28) nas redes sociais sobre a MP 868/18 – a Medida Provisória do Saneamento.

 

Segundo estabelece a MP, o saneamento básico pode ser operado pela iniciativa privada, o que facilita o processo de privatização das companhias estatais do setor.

 

Inicialmente, João Amoêdo publicou em seu perfil do Twitter um comparativo entre a eficiência do saneamento do Brasil e do Chile:

 

 

Marcelo Freixo comentou em suas redes sugerindo “aprofundar o debate” dizendo que “Saneamento é um assunto muito sério para ser tratado de forma tão superficial”.

 

 

João Amoêdo replicou:

 

“Espero que com as explicações abaixo, o deputado vote a favor da MP do Saneamento:

Na França, onde foi realizada a primeira concessão dos serviços de água da história, em 1853 (provando o quanto esta discussão está atrasada no Brasil), 2/3 dos franceses são atendidos por empresas privadas.

 

Paris, que possui saneamento básico universal – diferente do que diz o deputado – teve sua infraestrutura construída durante a gestão privada, que foi encerrada em 2010, após o termino do período de contrato. De fato, houve uma redução do custo tarifário após a estatização. Porém, foi feita pensando no curto prazo. A empresa estatal diminuiu o investimento em manutenção, que ficou em 1/3 da média francesa. A perda de água já aumentou e neste ritmo de investimento, demoraria-se 500 anos para trocar toda a rede, que tem vida útil de 50 anos.

 

Berlim nunca teve o sistema privatizado e sim uma empresa de controle público, com 50,1% de capital público e 49,9% com a iniciativa privada. A parceria durou 15 anos. Após um plebiscito, Berlim pagou 1,3 bilhão de euros para estatizar completamente o saneamento. Uma dívida que durará 30 anos para ser paga.

 

Já em Buenos Aires – historicamente influenciada pela mesmas ideias intervencionistas que o Brasil e o partido do deputado – houve um curto período de concessão para a iniciativa privada, marcado por descumprimentos contratuais pelo governo e pela empresa. Houve avanço durante este período, mas não foi suficiente e até hoje a província de Buenos Aires ainda está longe de completar a universalização do saneamento básico.

 

Vamos trazer essa discussão para o Brasil? No Rio de Janeiro, qual município lidera o ranking de saneamento? Niterói, que está próximo da universalização do saneamento básico, é operado pela iniciativa privada. Já na capital, operada pela estatal CEDAE, a coleta de esgoto atende a menos que 70% da população.

 

Sete dos 14 municípios que estão em melhores condições para alcançar a universalização do serviço no Brasil estão sob gestão da iniciativa privada. Como apenas 6% das empresas de saneamento no Brasil são privadas, vemos o tamanho da eficiência frente ao setor público.

 

Já que não há tabu por parte do deputado quanto à privatização, esperamos que ele vote a favor da MP, que facilita a operação por parte da iniciativa privada no saneamento, mas mantém para os municípios a decisão entre privatizar ou operar o sistema sanitário”.

 

 

Freixo fez a tréplica: “Vamos começar com a realidade brasileira”.

 

Continuando o debate sobre saneamento básico com João Amoêdo 30:

 

Vamos começar pela realidade brasileira. Sobre a suposta superioridade e eficiência das empresas privadas, basta olhar o ranking dos melhores do saneamento, elaborado pelo Trata Brasil, instituição que defende abertamente a privatização. Entre os 15 primeiros, existe apenas um prestador privado, e não é o de Niterói…

 

Em relação às experiências estrangeiras, na Alemanha, os municípios são responsáveis pela distribuição de água e pelo esgotamento sanitário. Cada um decide seu próprio modelo de gestão. Muitos optaram por criar empresas públicas municipais, que fazem a gestão de diferentes serviços urbanos. Essas empresas podem se abrir a capital privado, sendo que o município deve reter pelo menos 50% das ações. Desde 2012, cidades alemãs decidiram remunicipalizar seus serviços de água, sendo o caso mais emblemático o de Berlim.

 

Amoedo precisa estudar melhor o caso berlinense, a Agência Federal da Concorrência Alemã condenou a empresa de água de Berlim (parceria entre as companhias internacionais Veolia e RWE) a reduzir os seus preços em 18%, considerando abusivo o aumento de tarifas. Uma análise comparativa feita pela agência, mostrou que as tarifas eram significativamente superiores às de outras empresas, todas em propriedade pública.

 

Nos Estados Unidos, os serviços permanecem majoritariamente (85%) administrados pelos municípios como serviços públicos, sendo apenas 15% delegados à empresas privadas.

 

Na Inglaterra, as tarifas aumentaram 46% em termos reais durante os primeiros nove anos da privatização, os lucros operacionais mais do que duplicaram (+ 142%) em oito anos, os investimentos foram reduzidos e a saúde pública foi prejudicada por cortes de falta de pagamento. Os usuários sem capacidade de pagamento foram obrigados a reduzir o consumo a níveis que poderiam comprometer a saúde pública. A partir de 1998, tanto o corte como medidores de pré-pagamento foram considerados ilegais.

 

Na França, apesar de historicamente o modelo de delegação à iniciativa privada ser dominante, o tipo de contrato de delegação designado affermage se faz na base de investimentos públicos. A partir do final dos anos 90, vários fatores começaram a colocar em questão a renovação dos contratos com prestadores privados: a falta de transparência, perda de capacidade técnica e de conhecimento para monitorar o desenvolvimento de contrato. Houve um movimento de remunicipalização que envolveu cidades importantes, como Grenoble, Paris e Marselha.

 

Vale lembrar que os serviços de abastecimento de água e saneamento são monopólio; só pode haver uma rede de água na cidade; não há concorrência, os contratos são em média de 30 anos. O usuário não pode escolher entre duas empresas, como na telefonia, apregoada como o bom exemplo de privatização.

 

Não existe tabu em relação a qualquer debate, inclusive sobre privatização. Não desqualificamos a iniciativa privada de forma cega, como você e seu partido fazem em relação a tudo o que é público. Somos contrários à privatização porque levamos em conta a realidade brasileira, as experiências internacionais e pesquisas produzidas sobre o assunto. Para nós, direito não pode ser tratado como mercadoria.

 

 

 

Amoêdo finalizou com argumentos técnicos, trazendo mais números:

 

“É importante lembrar: dizer que algo é um direito não o torna gratuito. Precisamos pensar sempre em como viabilizar as políticas públicas, para que todos recebam serviços essenciais, como educação, segurança, saúde e saneamento básico.

 

Levando em conta a realidade brasileira, 14 estados gastam mais do que deveriam, superando a Lei de Responsabilidade fiscal. Metade dos municípios têm dívidas em atraso com fornecedores e um terço dos municípios terão dificuldades para equilibrar as contas em 2019. O governo federal tem déficit constante desde 2014.

 

Como se sabe, o gasto com saneamento é discricionário (não obrigatório). Com mais de 90% do orçamento engessado em gastos obrigatórios, os investimentos em saneamento acabam sendo cortados. Em 12 anos, avançamos apenas 3% na distribuição de água tratada e 13,5% na coleta de esgoto. No ritmo atual, o Brasil só terá saneamento básico universal em 2060.

 

Estima-se que 7 crianças morrem por dia devido à falta de saneamento. Aproximadamente, 10% das doenças no mundo e 18% das mortes infantis seriam evitadas com mais investimentos em água potável e saneamento básico. Não podemos adiar mais a solução deste problema, que deveria ter ficado no século passado.

 

Não faz sentido falar em aumento de impostos, já que temos uma carga tributária de 33,6%, comparada a países desenvolvidos (média de 36,4%) e muito acima dos países emergentes (média de 27,4%) e nossos vizinhos na América Latina (média de 21,7%). O único efeito desta medida seria o aumento da crise e do número de 13 milhões de desempregados.

 

E agora falando de soluções: a MP do Saneamento promove e facilita a abertura para investimentos da iniciativa privada e traz maior segurança jurídica para o setor. Com a MP do Saneamento, todos os contratos de saneamento precisarão de concorrência pública baseada em investimentos e outros critérios técnicos. Dessa forma, as empresas estatais também poderão participar da concorrência. Basta serem mais eficientes que as da iniciativa privada. A MP também dá transparência a eventuais subsídios, incentivando a destinação de recursos para quem mais precisa.

 

Espero que esse debate seja concluído com o deputado tratando da MP do Saneamento, que pode perder sua validade caso não seja votada no Congresso, ou apresentando soluções alternativas viáveis para este problema.

 

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Outras informações sobre a resposta do deputado:

O dado de que sete dos 14 municípios que estão em melhores condições para universalização do serviço possuem gestão da iniciativa privada foi divulgado pela ABES (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental).

 

Um estudo francês, feito em 2012, com 177 operadores concluiu que não existe correlação entre o preço dos serviços de água e esgoto e o tipo de prestador.

 

Os EUA, citados pelo deputado, alocaram 600 bilhões de dólares em saneamento básico para os próximos 20 anos, em parceria com a iniciativa privada. O valor é quase o dobro do orçamento anual do governo federal brasileiro. Fica claro que o governo federal brasileiro não tem estes recursos. Novamente pergunto, qual seria a solução, para o deputado?”, encerrou.

 

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Até o momento não houve mais nenhuma resposta do deputado Marcelo Freixo para fazer o contraponto.

 

 

Debate de ideias e sugestões com informações claras são importantes para melhorar a nossa política. Seria muito bom para o país mais ações assim. O Brasil só tem a ganhar.

 

 

Imagem: Conexão Política

 

 

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