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Editorial: Reforma tributária – oportunidade perdida
A frase “pior que tá não fica” vem ganhando um gosto amargo no Brasil. Muita gente que a repetiu nos últimos anos percebeu que, quando se trata da política, da economia e da estrutura do Estado brasileiro, o que está ruim pode, sim, piorar. Esse também parece ser o caso do nosso sistema tributário. O Congresso está correndo o risco de fazer o impossível: deteriorar um sistema que já é um dos mais complicados e disfuncionais do mundo.
Há pelo menos quatro problemas graves no texto aprovado pelo Senado esta semana:
1. Transição lenta e incerta. Uma das principais expectativas era a de que a reforma acabasse com a tributação de ICMS na origem. Em quase todo o mundo, a tributação sobre o consumo ocorre no destino, ou seja, onde o produto foi consumido. No Brasil, como também se tributa ICMS na origem, há uma infinidade de regras locais diferentes e descontos, que diversas distorções. Abatedouros ou fábricas de automóveis se instalam em regiões sem vocação para essas atividades, só para aproveitar a menor tributação.
No entanto, segundo o texto aprovado no Senado, a alíquota de ISS e ICMS vai continuar a mesma até 2029, quando começa a cair. Em 2032, ainda será 60% da atual. Os benefícios do ICMS que possibilitam a guerra fiscal entre os estados estão mantidos até 2033, mas isso sempre pode ser prorrogado ou adiado ao sabor da pressão política. Não há, portanto, garantia de que haverá de fato a migração para a tributação no destino.
2. Aumento do IPTU. O texto autoriza os prefeitos atualizarem por decreto a base de cálculo do IPTU. Hoje, a alteração do valor venal dos imóveis precisa passar pela Câmara Municipal. Contestações judiciais sobre IPTU, que hoje já são um quarto das ações tributárias, devem seguir numerosas.
3. Infinidade de exceções. As centenas de emendas acatadas pelos senadores prevêem isenções e descontos de 30% ou 60% para produtos e serviços dos mais diversos, incluindo o marketing político, jornalismo, bancos, times de futebol, profissionais liberais e “bens e serviços relacionados à soberania e à segurança nacional”.
O texto permite que os estados criem uma contribuição sobre produtos primários e semielaborados e garante desconto a veículos produzidos no Nordeste, além de uma contribuição para o Centro Oeste. São benefícios e privilégios que contrariam o espírito da reforma, o de criar uma uniformidade tributária.
Certamente muitos empresários tentarão enquadrar sua atividade numa das categorias favorecidas, ação que deve ser contestada por fiscais da Receita. Ou seja: o Brasil pode continuar sendo o país com mais disputas tributárias na Justiça.
4. Atividades extrativas. O imposto seletivo, chamado “imposto do pecado”, vai incidir sobre atividades extrativas – o que pode encarecer diversos insumos usados por indústrias.
O fim do manicômio tributário seria uma benção para o Brasil, uma reforma que aumentaria nossa produtividade e teria efeitos valiosos para o crescimento da economia. Mas ao ceder à pressão de grupos de interesse, o Congresso está perdendo mais uma oportunidade histórica de consertar o país.
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